Por Claudia Safatle
A presidente Dilma Rousseff pretende
dar a "segunda virada" em seu governo no mês de agosto, quando
anuncia um pacote de medidas com a redução do preço da energia para o setor
produtivo, as concessões de ferrovias, portos, rodovias e aeroportos, a
renovação das concessões de energia e a simplificação do PIS/Cofins, entre
outras medidas.
A "primeira grande virada"
foi exatamente há um ano, em agosto de 2011, quando o Banco Central vislumbrou
uma ampla janela na cena internacional e doméstica para cortar a taxa básica de
juros (Selic). Foram vários os fins de semana entre julho e agosto que o
presidente do BC, Alexandre Tombini, passou ao telefone, conversando com
dirigentes dos bancos centrais do mundo para tomar pulso da dimensão da crise
que se avizinhava. Geralmente, acompanhado de outros diretores do BC e na casa
de um deles. Tombini, na mesma ocasião, foi aos EUA. Nas conversas que teve
ouviu uma revisão dramática do crescimento global. Para ele, 9 de agosto foi o
divisor de águas. Nesse dia o Fed anunciou o adiamento de um eventual aumento
da taxa de juros de 2013 para 2014.
Na reunião do Comitê de Política
Monetária (Copom) de 31 de agosto de 2011 a direção do BC surpreendeu a todos
com um corte de 0,5 ponto percentual, levando a Selic para 12% ao ano. Tombini
via o que quase ninguém ainda via: a crise externa derrubaria as economias
maduras por um bom tempo. Isso representaria uma "overdose" de
restrição ao crescimento da economia brasileira, que já estava sob um aperto
monetário desde dezembro de 2010. Não cortar os juros ali jogaria o Brasil numa
recessão.
A primeira foi a queda dos juros em
agosto de 2011
Naquele momento, Dilma teria lhe passado uma mensagem de tranquilidade: se o BC tiver que subir os juros mais adiante, que suba. Ele não é escravo de nenhum compromisso, conta um assessor muito próximo da presidente.
Naquele momento, Dilma teria lhe passado uma mensagem de tranquilidade: se o BC tiver que subir os juros mais adiante, que suba. Ele não é escravo de nenhum compromisso, conta um assessor muito próximo da presidente.
De lá para cá, os juros básicos foram
desbastados em 4,5 pontos percentuais e a taxa se encontra em 8% ao ano - o
patamar mais baixo de toda a história do Copom, criado em 1996.
Hoje a discussão no mercado
financeiro é sobre a extensão do ciclo de afrouxamento monetário. A maioria não
alimenta dúvida sobre mais uma queda para 7,5% ao ano, na reunião
de agosto do Copom. Mas não está claro se o BC vai parar aí, se cortará mais em
outubro ou se diminuirá o tamanho da redução para 0,25 ponto percentual para,
então, interromper o ciclo.
Na ata divulgada ontem há pelo menos
três sutis - mas importantes - mudanças de linguagem em relação à ata de maio.
O comitê fala em "recuo" na probabilidade de eventos extremos nos
mercados internacionais; troca "contenção" fiscal por uma política de
"neutralidade" do gasto público; e considera
"significativo" o risco de aumentos de salários incompatíveis com o
crescimento da produtividade.
O comitê, portanto, mostra um mundo que
poderá ou não permitir cortes adicionais ao que eventualmente ocorrerá em
agosto e dá sinais de que vê o mercado pessimista com a atividade econômica.
Mas não amarra as suas mãos.
O BC, atualmente, está atento ao que
pode ocorrer nessa nova realidade do país, pós-corte dos juros. "É um
mundo novo para todos. Temos que ter cuidado, porque é outro gerenciamento de
risco. Aumenta a vontade de se atirar em ativos mais arriscados", alertou
uma fonte qualificada da área econômica.
Dessa forma, foi a
"revolução" promovida no custo do dinheiro que a presidente considera
a primeira grande "virada" do seu governo, no ano passado, e não a
queda do então chefe da Casa Civil, Antônio Palocci, ou a limpeza feita nos focos
de corrupção em seu ministério.
Em março deste ano Dilma
fez a primeira reunião com um grupo de grandes empresários privados para
avaliar as razões da postergação de investimentos. Deles ouviu várias
reclamações, dentre elas o pesado custo da energia, a apreciação demasiada da
taxa de câmbio, os onerosos encargos trabalhistas, a péssima infraestrutura e a
ainda alta taxa de juros.
No segundo encontro, em maio, ela pode
apresentar a essa mesma plateia alguns avanços: com a intervenção do BC o
câmbio já estava mais desvalorizado, os juros continuavam em queda e o governo
encaminhava as desonerações da folha de salários, reduzindo os encargos
trabalhistas para mais setores empresariais. No dia seguinte a essa reunião, a
presidente aprovou a esperada e temida mudança na regra de remuneração da
caderneta de poupança, para que o Copom pudesse prosseguir no corte da Selic.
Também em maio Dilma foi informada de
que o país não cresceria nem 3% este ano e que os investimentos - tanto
públicos quanto privados - não andavam. Foi quando decidiu renovar a agenda do
governo para a economia e adotou o lema - "vamos fazer o que tem que ser
feito", conta uma fonte qualificada.
Desde então, trabalha-se no pacote de
agosto, com foco no papel indutor do Estado para atrair o investimento privado.
O bloco de concessões, por exemplo, será colocado na mesa como um plano de
desenvolvimento da logística que faça nexo, envolvendo portos, aeroportos,
rodovias e ferrovias.
A redução dos tributos federais sobre a
energia, o corte de encargos e a rodada de concessões vão reduzir algo entre 10
% e 20% o preço desse insumo para a indústria. Os encargos que oneram a fatura,
como a Conta de Consumo de Combustível (CCC), Conta de Resultados a Compensar
(CRC) e Luz para Todos, dentre outros, serão transferidos da tarifa de energia
para o Tesouro Nacional. Como são subsídios e políticas sociais, serão alojados
no Orçamento da União. O consumidor deixará de pagá-los na conta mensal de
energia mas, como contribuinte, assumirá a despesa do Tesouro.
Dilma aprovou as ações de incentivo ao
consumo do ministro da Fazenda, Guido Mantega, como medida emergencial à mão
para reativar a economia. Mas quer de fato é "desencantar" o
investimento, sem qualquer preconceito. E não será surpresa se anunciar alguma
reforma estrutural.
Claudia Safatle é diretora adjunta de
Redação e escreve às sextas-feiras
E-mail: claudia.safatle@valor.com.br
Fonte: Valor Econômico
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