sexta-feira, 20 de julho de 2012

DILMA PEDE À ANATEL LINHA DURA COM AS TELES


Agência rejeita plano de investimentos apresentado pela Claro e mantém decisão de suspender vendas na segunda
Presidente quer que órgãos reguladores deixem claro que defendem os clientes e não as empresas
DE BRASÍLIA
 

A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) recusou ontem uma tentativa da Claro de reverter a suspensão nas vendas de chips e linhas, mantendo a punição também à Oi e à TIM.
A Claro apresentou um projeto de investimento para os próximos dois anos, uma das condições anunciadas pela agência para reverter a suspensão nas vendas.
O superintendente de Serviços Privados da Anatel, Bruno Ramos, afirmou que a proposta não era suficiente.
"Queremos dados de aumento de capacidade mensal. Queremos também que eles apresentem investimento em equipamento para melhoria de rede, para diminuir a interrupção do serviço, e em melhorias ao atendimento."
A posição da Anatel segue uma orientação geral do governo para que os órgãos reguladores sejam mais severos com as empresas que não prestarem serviços de qualidade. A presidente Dilma Rousseff já cobrou diversas vezes que as agências defendam os interesses dos clientes, não das companhias.
Documento preliminar da agência diz que a suspensão foi provocada pela "crescente evolução do indicador de número de reclamações dos usuários" em relação a dois aspectos: a interrupção das ligações e o não completamento das chamadas.
RANKING DA ANATEL
Dados obtidos pela Folha mostram que, entre janeiro e junho, considerando todo o país, a TIM liderou as queixas em relação à sua base de clientes, seguida da Oi, da Claro e da Vivo.
A Anatel suspendeu em cada Estado uma operadora diferente, usando como critério o índice de queixas em relação ao número de clientes.
Em São Paulo, a operadora punida foi a Claro, que motivou mais reclamações em relação a sua base de clientes, seguida pela TIM, pela Oi e pela Vivo, que não foi suspensa em nenhum Estado por não liderar queixas.
O índice usado pela Anatel e o ranking diferem dos divulgados pelos órgãos de defesa do consumidor, porque são relativos à base de consumidores e porque eles procuram a agência depois de não terem seus pleitos atendidos.
A Anatel discutia ontem a proposta de obrigar as operadoras a informar nas lojas que estão proibidas de vender linhas porque a qualidade dos serviços está sendo avaliada.

(ANDREZA MATAIS E JULIA BORBA)

Perguntas e Respostas
1 O que as operadoras estão proibidas de vender?
Novos pacotes de voz e dados

2 Quando começa a valer a proibição?
A partir de segunda (23.jul)

3 Vale até quando?
Até as operadoras apresentarem um plano de investimento à Anatel. O prazo para isso é de 30 dias

4 O que muda para quem já tem linhas dessas operadoras?
Nada


Cliente troca plano e procura chip novo em cidade vizinha
Consumidor reclama de qualidade, mas prefere garantir operadora
Morador de Porto Alegre, onde as 4 empresas estão suspensas, compra linha na vizinhança
A proibição da venda de linhas em Porto Alegre fez o movimento crescer nas lojas da região metropolitana.
As quatro operadoras -Oi, Vivo, TIM e Claro- foram suspensas na cidade desde segunda-feira, pelo Procon.
A gerente Aline Barros, de uma loja da Oi em um shopping de Canoas, diz que a semana vem sendo agitada no estabelecimento devido a clientes que não encontram chips e serviços em Porto Alegre. A cidade fica a 15 km do centro da capital gaúcha.
"Para alguns, existe a necessidade de comprar uma linha para o trabalho", diz.
O Procon de Porto Alegre está fiscalizando o cumprimento da decisão, tomada devido a problemas de sinal na cidade e ao excesso de reclamações. As lojas só podem comercializar novos aparelhos, sem ativar novos chips.
Devido à iniciativa da Anatel, a partir da próxima semana, a Oi também não poderá vender mais novas linhas em todo o Rio Grande do Sul.
A corretora de imóveis Ângela Bonfanti, 48, decidiu se antecipar à medida e foi a uma loja de Canoas. "Queria fazer um plano mais barato e a gente não sabe como vai ser. De repente resolvem trancar não só a venda."
SÃO PAULO
Mesmo ciente da decisão da Anatel, a secretária Renata Mourão, 30, habilitou nesta quinta-feira uma linha da Claro. "Vou usar a linha para trabalho e já temos quatro telefones da operadora", diz.
Apesar da compra, ela diz que concorda com a decisão da agência de suspender a comercialização de novas habilitações. "O serviço é muito ruim. Mas não temos opção, todas as operadoras são horríveis, nem adianta mudar."
Para o empresário Eduardo Siqueira, 45, a qualidade do serviço da operadora vem caindo nos últimos anos. "Ontem [anteontem] mesmo, eu liguei para eles para reclamar do sinal", diz. Cliente há cinco anos da operadora, ele, no entanto, não pensa em mudar. "Minha família toda é Claro. Seria muito trabalhoso para todo mundo."
Já o médico Celso Svartmam, 67, diz já ter se acostumado com as falhas na cobertura da operadora. Ele é cliente da Claro há quatro anos.
A dona de casa Vilma Pereira se queixa da qualidade da conexão à internet 3G da Claro em São Paulo, serviço que contratou em setembro de 2011. "Desde o começo do ano, a velocidade fica abaixo da internet discada, com demora de até 5 a 6 minutos para carregar página."
Funcionários de lojas de operadoras de celular no Rio não registraram corrida de consumidores para comprar planos de voz e dados.
No Estado, a TIM ficará impedida de vender novos planos no Estado.
(FELIPE BÄCHTOLD, THIAGO FERNANDES e LUCAS VETTORAZZO)

Análise
Problemas existem, mas Anatel ainda deve explicar seus critérios
ARTHUR BARRIONUEVO
ESPECIAL PARA A FOLHA
 

A proibição de angariar novos assinantes imposta pela Anatel à TIM (em 19 Estados), à Claro (em 3 Estados) e à Oi (em 5 Estados), preservando apenas a Vivo e as operadoras menores, causou grande impacto na opinião pública.
Para uma análise que elucide a questão, dois aspectos devem ser examinados.
Primeiro, as deficiências de serviço que têm afetado os consumidores. Segundo, a atuação da Anatel e a responsabilidade das operadoras pela situação atual.
O serviço móvel continua a crescer aceleradamente no país, de 173,9 milhões de linhas em dezembro de 2009 para 254,9 em maio de 2012, aumento de 46% em 2,5 anos.
O número de minutos gastos mensalmente por usuário também cresceu, entre dezembro de 2009 e dezembro de 2011, de 83 para 129 minutos na TIM e de 84 para 100 na Claro.
Ao mesmo tempo, a receita por usuário caiu em reais: -26% na TIM e -30% na Claro entre 2009 e 2011. Também foi acelerada a cobertura 3G no período. Logo, há grande demanda de investimentos para essas necessidades.
É factível, portanto, que o sentimento de insatisfação de usuários reflita problemas efetivos com o serviço em algumas regiões do país.
Onde? Aqui está o problema, já abordando o segundo tema, a atuação da Anatel e das operadoras.
Ninguém sabe por que essas empresas foram punidas em cada Estado. Qual foi o critério? Parece que o pior resultado nos índices de qualidade da Anatel em cada Estado foi a justificativa para a suspensão. Todavia, o pior índice em um Estado pode indicar qualidade razoável e o melhor índice em outro pode ser inaceitável.
Sem conhecer os critérios, não se pode afastar a hipótese de arbitrariedade.
A Anatel divulga 12 indicadores de qualidade (SMP1 a SMP12). Aí surge outra surpresa: quando se analisa o cumprimento das "Metas de qualidade atendidas pelas operadoras" entre 2007 e 2011, o índice nunca caiu abaixo de 96% para o Brasil.
Mesmo em abril de 2012, o dado mais recente, é de 95,5%. Note-se que algumas empresas estão abaixo da média, ainda assim, acima de 84%, valores elevados.
Em indicadores que mostram a qualidade do serviço -como o SMP2 (taxa de reclamação de cobertura e de congestionamento de canal de voz por mil acessos), que deve ser menor do que 4%; SMP5 (Taxa de chamadas originadas completadas), que deve ser maior do que 67%, e SMP7 (Taxa de queda de ligação), que deve ser menor do que 2%-, todas as operadoras cumpriram as metas.
Surpreende então a violência das medidas adotadas. Houve, como se sabe, movimento de Procons (especialmente no RS) e reclamações do governo sobre investimento das operadoras. Não são razão suficiente.
Ainda mais quando se sabe que a legislação municipal, em vários locais, dificulta muito a instalação de antenas e a melhora do serviço.
Sem negar que problemas devem ser resolvidos, a Anatel ainda deve melhor fundamentação para seus atos.
ARTHUR BARRIONUEVO é professor da FGV-SP, especialista em concorrência e regulação e ex-conselheiro do Cade.


Fonte: Folha de S.Paulo

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