A
Lei nº 9.613, de março de 1998, que dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou
ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização de sistema
financeiro para os ilícitos, recentemente, foi alterada pela Lei nº 12.683, de
2012, que tornou mais rigorosa a fiscalização e ampliou as punições para os
referidos crimes.
A
aludida fiscalização merece destaque especial no que tange à inclusão das
Juntas Comerciais e dos Registros Públicos em manterem seus cadastros
atualizados nos termos das instruções emanadas pelas autoridades competentes.
Segundo
a alteração legislativa, os órgãos responsáveis pelo registro, seja mercantil
ou civil, deverão informar ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(Coaf) qualquer operação ou transação em moeda nacional ou estrangeira que se
relacione com títulos e valores mobiliários, títulos de créditos, metais, ou
ativos passível de ser convertido em dinheiro, toda vez que ultrapassa o limite
fixado pela lei.
Os
registradores adotarão procedimentos e controles internos compatíveis com o
volume de operações que lhes permitam atender todas as demandas para controle,
criando bancos de dados em nível nacional, com informações sobre todos os
movimentos das atividades negociais do país.
Será
necessário, assim, um cadastro atualizado na forma e condições formuladas pelo
Coaf, contendo as informações relativas às operações que, nos termos de
instruções e emanadas pelas autoridades competentes, possam constituir-se em
sérios indícios de crimes, ou com eles relaciona-se.
Cumpre
ainda dizer para aqueles deixarem de cumprir as obrigações previstas serão
aplicadas, cumulativamente às sanções de advertências; multa pecuniária que
poderá chegar ao valor de R$: 20 milhões.
Como
se vê, o intuito do legislador foi permitir que os órgãos de controle e
fiscalização tivesse acesso automático aos atos de vida empresarial e também
civil das pessoas físicas e jurídicas, evitando que determinados meios, ainda
que legais fossem inadequadamente utilizados para evasão fiscal, lavagem de
dinheiro e crimes corrupção.
As
juntas comerciais não têm atribuição legal de fiscalização.
As
informações que o poder publico terá acesso “on-line” impressiona pela
grandeza, considerando que deveram ser catalogados todos os dados pelas juntas
comerciais, pelos cartórios de registros civil de pessoas jurídicas e pelos
tabeliães em que serão lavradas procurações, escrituras publicas de qualquer
ato da vida civil praticados nos mais de 7 mil cartórios brasileiros – Como
nome da pessoa, tipo de ato e local onde foi lavrado.
Ate
os velhos instrumentos conhecidos como “contratos de gavetas” poderão ser
facilmente detectados, observando que, doravante, será possível fazer uma
pesquisa no sistema e saber se consta uma procuração em qualquer local do país
em nome do individuo ou se a qualquer outro documento que o atrele aquela
operação societária (cessão de quotas, cisão, incorporação, transformação de
tipo societário ou venda de ações de companhia fechada).
Nesta
toada, não há duvidas quanto a necessidade, validade e importância de adoção de
novas e vigorosas medidas que combatam o crime organizado e lavagem de
dinheiro, ou ocultação de bens, contudo, algumas reflexões são necessárias
quanto às escolhas do legislador quanto ao formato da lei, quando de sua
propositura. Assim vejamos: do ponto de vista técnico – jurídico,
especificamente, no que toca o registro de empresa, as Juntas Comercias
deveram, com o escopo “fiscalizador”, comunicar ao Coaf toda a transação e operação
societária que possa ser indicio de crime, ou com ele relacionar-se.
Ocorre
que,na realidade, as Juntas não têm a atribuição legal de “fiscalizador” e nem,
na pratica, possuem condições técnicas para discernir se uma operação
societária se trata ou não de um crime de lavagem de dinheiro. Ademais, grosso
modo, dependendo da analise e da ótica, qualquer operação que tenha por
finalidade uma cisão, fusão, incorporação, transformação de tipo societário, aumento
de capital social com incorporação de bens imóveis ou simplesmente uma cessão e
transferência de quotas, pela dubiedade da lei, pode ser interpretada como
indicio de crime de lavagem de dinheiro. Quer dizer: há, por certo, uma lacuna,
uma subjetividade excessiva da interpretação legislativa; deixando a cargo de
assessores técnicos e vogais das Juntas Comerciais – sem o devido preparo,
embasamento e treinamento para tanto-, a avaliação sobre a possibilidade de
tratar-se ou não crime de lavagem de dinheiro.
O
problema é muito serio, como se vê, tendo em vista que qualquer ato societário,
em razão de uma interpretação rasa e superficial, por parte do Registro Publica
de Empresas Mercantis, poderá ter sua operacionalidade enquadrada numa daquelas
previstas na lei como forma de ocupação de bens!
Na
verdade, falta às Juntas Comerciais uma melhor orientação, pois, para
solucionar o problema, bastaria que o Departamento Nacional de Registro do
Comercio (DNRC) baixasse uma Instrução Normativa regulamentado e elencando as
hipóteses em que realmente houvesse necessidade de comunicação ao Coaf,
levando-se, objetivamente, em conta a transação e operação societária com
indicio de crime de lavagem ou ocultação de bens, sem que isso cause injustiças
ou abusos para as sociedades e seus sócios.
Enfim,
não há duvidas que a Lei de Lavagem de Dinheiro é um importante avanço para o
Brasil, mas sua aplicação ainda deve ser objeto de uma regulamentação, serena,
equilibrada e, principalmente, respeitadora das instituições e do Estado
Democrático de Direito.
Autor: Armando Luiz Rovai é doutor pela
PUC-SP, Professor de Direito Comercial da Faculdade de Direito do Mackenzie e
da PUC-SP e ex-presidente da Junta Comercial do Estado de São Paulo por três
mandatos. Fonte: Valor Econômico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário